A UNITA, o maior partido da oposição que o MPLA permite que exista em Angola, defende que as operações apresentadas como de segurança em curso no país são “insuficientes” para resolver os problemas estruturais do país, já que apenas atacam os “sintomas” e “não as causas profundas”. Contudo, o MPLA nunca disse que queria resolver as “causas profundas”. Se as resolvesse o partido que reina desde 1975… acabaria.
A crítica da UNITA está contida num comunicado saído da reunião do Comité Permanente da Comissão Política e relacionado com a análise que faz às operações “Transparência” e “Resgate” em curso no país.
“A UNITA considera que os grandes e endémicos males que assolam as famílias angolanas exigem grandes remédios que ataquem as causas profundas dos problemas e não apenas os seus sintomas”, refere-se no comunicado da reunião, que foi presidida pelo líder do partido, Isaías Samakuva.
Para a UNITA, as “causas profundas” passam pelo “colapso” dos sistemas de saúde, de valores e financeiro e o “aumento vertiginoso” dos crimes económicos e financeiros “pelos ricos”, pelas “altas taxas” de desemprego, pelas “fraudes que penalizam o consumidor” e pela “falta de confiança dos cidadãos nas instituições do Estado”.
“Estes são o resultado directo da captura do Estado pela oligarquia que se apoderou de Angola e da ineficácia das suas políticas públicas”, lê-se no documento, em que o partido do “Galo Negro” considera “insuficientes” as duas operações de segurança destinadas a “atacar as causas dos problemas estruturais do País e recuperar a autoridade moral e política da Administração Pública”.
“O Comité Permanente da Comissão Política da UNITA exorta o Executivo angolano a implementar políticas eficazes que concorram para a refundação do Estado, para uma mudança efectiva da cultura da governação e para formas mais justas e eficazes de distribuição e controlo da riqueza nacional, visando a dignidade da pessoa humana”, defendeu.
A “Operação Transparência”, iniciada a 25 de Setembro e que decorre actualmente em 11 das 18 províncias angolanas, tem por objectivo – segundo os operacionais de propaganda o Governo – pôr termo à imigração e garimpo ilegais em Angola e já levou ao repatriamento de mais de 400 mil estrangeiros, maioritariamente da vizinha República Democrática do Congo (RD Congo).
A “Operação Resgate”, por seu lado, começou a 6 deste mês e decorrerá por tempo indeterminado, visando supostamente repor a autoridade do Estado em todo o país, através de uma fiscalização, que pode ser repressiva, a uma série de comportamentos e atitudes que são transversais a todos os sectores do país.
A operação visa, sempre de acordo com as “ordens superiores” transmitidas para a opinião pública, sobretudo reduzir os principais factores desencadeadores da desordem e insegurança, bem como os da violência urbana e da sinistralidade rodoviária, aperfeiçoar os mecanismos e instrumentos para a prevenção e combate à imigração ilegal e proibir a venda de produtos não autorizados em mercados informais.
Propaganda não é a realidade
No dia 22 de Outubro, Isaías Samakuva afirmou que “estão equivocados” os que, face às medidas populares tomadas pelo Presidente angolano, pensaram que o papel da oposição ficou “esvaziado”, garantindo que sucedeu o contrário.
“Estão enganados, porque é precisamente o contrário. É o Presidente da República que vem ao encontro dos anseios do povo por mudança e é assim que deve ser”, afirmou Isaías Samakuva, numa “réplica” ao discurso sobre o estado da Nação, proferido por João Lourenço, no Parlamento, a 15 de Outubro.
Mais uma vez tem razão. No entanto, como habitualmente, o líder da UNITA esquece-se que uma coisa é o que os políticos pensam e outra, bem diferente, é o que o Povo entende. E, hoje, os angolanos começam a pensar que afinal a Oposição já não é útil porque o “exonerador implacável” está a fazer tudo o que o país precisa.
E isto acontece porque a UNITA (a CASA-CE é apenas uma sombra intermitente) está em cima de um tapete rolante que anda para trás. Samakuva limita-se a andar em cima desse tapete. Fica, é claro, com a sensação de que está a ganhar terreno, mas na verdade está sempre no mesmo sítio…
Samakuva lembrou que João Lourenço tem feito “algumas promessas e até cumprido algumas”, mas sublinhou ser ainda cedo para se tirarem conclusões sérias.
Isaías Samakuva manifestou “total disponibilidade da UNITA para trabalhar com o MPLA (partido no Poder desde 1975) e com João Lourenço”, na implementação do que considerou ser uma “agenda nacional para a mudança efectiva do sistema que capturou o Estado e institucionalizou a corrupção” no país.
Este patriotismo, este sentido de Estado evidenciado por Isaías Samakuva é visto pelo Povo (ou seja, por quem vota) como uma capitulação, como uma caminhada de derrota em derrota até à… derrota final. E assim a UNITA não vai lá. E não vai porque Angola ainda não é o que Samakuva pensa que é: um Estado de Direito onde primeiro estaria Angola e só depois os partidos.
Tanta ingenuidade política chega a parecer uma rendição total. Isto porque a UNITA sabe há muito que “Angola é o MPLA e o MPLA é Angola”. Não adianta querer acabar com a hiena pedindo a ajuda do leão. O leão derrotará a hiena e depois vai comer a… UNITA.
Para o líder da UNITA, João Lourenço tem ainda um longo caminho a percorrer, até porque, disse, para se corrigir o “muito de mal que está no país”, tem de se reconhecer, primeiro, as “raízes do mal”, que estão no “partido-Estado”, o MPLA.
“A raiz do que está mal na governação não é a corrupção, nem a impunidade, nem a bajulação [palavras que João Lourenço disse no Congresso do MPLA, em Setembro, e que repetiu no Estado da Nação]. Estes três males são consequência de um mal muito maior, que é a raiz de todos os males: a própria natureza do regime político instalado em Angola pelo MPLA”, afirmou o líder da UNITA.
Isto sim. Isto é liderar a Oposição e não ter medo de dizer a verdade. Mas quando Samakuva dá uma no cravo, outra na ferradura e duas nos próprios dedos, mostra que não tem fibra para ser a alternativa. Se a tivesse nunca diria estar disponível para colaborar com o MPLA.
“Lamentar, quando o momento exige acção, é favorecer o inimigo”, afirmava Jonas Savimbi, que também disse: “Tentámos, por todos os meios possíveis, cooperar com o governo do MPLA no sentido de encontrarmos, em conjunto, formas de alcançarmos a paz e não obtivemos sucesso. Quanto mais estendo as minhas mãos em busca da paz, o governo mostra-se relutante em cooperar. Portanto senhor Jornalista, não me restam dúvidas, a guerra está a enriquecê-los e a martirizar o povo”.
Samakuva diz hoje algo parecido, mas muito inferior em convicção e espírito de luta: “No lugar do Estado de Direito Democrático, o MPLA instalou em Angola uma oligarquia que capturou o Estado e apoderou-se da economia nacional, com o objectivo calculado de criar teias de cumplicidades para subjugar a cidadania angolana e perpetuar-se no poder”.
Será que, como Jonas Savimbi, Isaías Samakuva pode hoje dizer: “Acredito que amanhã os angolanos hão-de entender o real motivo da minha luta. E nesse dia, homens e mulheres da minha pátria, letrados ou não, hão-de caminhar em busca da verdadeira paz, em busca da verdadeira democracia. Terão a coragem de enfrentar o regime. Porque não há na história da humanidade um governo que tenha oprimir um povo eternamente”?
Folha 8 com Lusa